A Medida Provisória (MP) dos fundos exclusivos, assinada na segunda-feira, pode impactar o mercado de fundos imobiliários (FII) e fundos da cadeia produtiva do agronegócio (Fiagro) no médio e longo prazos, segundo especialistas ouvidos pelo Valor. As mudanças trazidas pelo texto preveem fim de isenção de cobrança de imposto de renda sobre dividendos distribuídos, se os veículos não forem negociados na bolsa ou balcão e caso possuam menos de 500 cotistas.
A regra anterior previa que a isenção valia para FIIs e Fiagros com 50 ou mais cotistas. A previsão para fundos desenquadrados das novas exigências é de uma cobrança de 15% a 20% sobre os rendimentos.
Levantamento feito pelo Clube FII a pedido do Valor indica a existência de 114 fundos listados, com número de cotistas entre 50 e 500. O patrimônio líquido desse grupo de portfólios soma um total de R$ 21,19 bilhões.
Outro levantamento, da Quantum Finance, mostra que há no total, entre FIIs listados e não listados com menos de 500 cotistas, 552 veículos. Segundo a casa, na carteira do Índice de Fundos Imobiliários da B3 (Ifix), não existe nenhum portfólio que esteja desenquadrado da regra. O FII com menor número de cotistas do referencial reúne mais de 5,4 mil investidores.
De acordo com a pesquisa do Clube FII, do total de 114 fundos listados, 69 FIIs fizeram distribuições de dividendos no último mês que somaram R$ 213,8 milhões. Conforme o Clube FII, se esse valor for anualizado, contabiliza cerca de R$ 2,57 bilhões de dividendos hoje isentos que vão ser taxados. No caso de uma alíquota de 15%, o novo imposto resultaria em uma arrecadação extra de R$ 385 milhões. No teto da cobrança, o montante subiria para R$ 514 milhões.
Apesar de o montante ser pequeno em termos de contribuição para a meta de aumento da arrecadação do governo de R$ 3,2 bilhões para este ano, a mudança vem dentro de uma estratégia de evitar brechas para recursos migrarem dos fundos exclusivos para outros veículos isentos. “A MP ataca justamente as estruturas de ‘casca tributária’ e os separa dos fundos detidos e negociados pelo investidor de varejo que verdadeiramente representam a essência da isenção”, afirma o sócio da Jive Investments e executivo-chefe de investimentos (CIO) de fundos da Mauá Capital, Brunno Bagnariolli.
O analista de FIIs do Santander, Flávio Pires, compartilha de visão semelhante. “A MP vai gerar impacto limitado para os fundos imobiliários”, afirma o especialista.
O CEO da Integral Brei, Vitor Bidetti, porém, aponta mudanças na dinâmica do mercado após a MP. “A exigência de 500 cotistas ou mais pode inviabilizar a oferta de novos fundos de menor porte”, explica. “Muitos FIIs fazem sua primeira emissão com metas de captação de R$ 100 milhões ou menos. Fica difícil manter esse patamar. As novas estruturas vão ter uma régua bem mais alta para sair do papel. E isso é mais impactante para os Fiagros, que é uma indústria nascente.”
Conforme Bidetti, em momentos de menor demanda, como na recente crise quando o valor de mercado ficou significativamente abaixo do patrimonial, as emissões primárias tendem a ficar ainda mais cautelosas. “Nessas janelas de mercado em baixa, as novas regras podem travar as emissões de novos fundos, que vão ter de esperar até um momento mais favorável [para conseguir demanda suficiente com aumento dos tamanhos das emissões]”, avalia.
Conforme o sócio-diretor de pesquisa e planejamento do Clube FII, Danilo Barbosa, “a MP cria uma barreira, porque 500 pessoas é mais difícil de se conseguir [no lançamento de um fundo]”. O especialista, no entanto, acredita que o novo limite de cotistas para assegurar isenção pode ser alcançado mesmo por novos FIIs com patrimônio líquido abaixo de R$ 100 milhões.
Barbosa também afirma que as regras vão estimular uma consolidação no segmento. “Esse será o caminho. Pode ter essa aglutinação de fundos menores sendo absorvidos por outros maiores na mesma gestora, mas também vejo um movimento de M&As de veículos que vão ser taxados sendo adquiridos por outras casas.”
Fonte: Valor Econômico